sábado, 13 de julho de 2013

Lei 10.639 Didática

Lei 10.639  Didática PDFE-mail
       
A QUESTÃO DIDÁTICA
As fontes de ensino
É possível antecipar que a implantação do ensino da história da África no Brasil( Lei 10.639 ) apresentará problemas que também tiveram que ser enfrentados e resolvidos no continente africano. Considerando a visão negativa sobre a África que predominou na sociedade brasileira durante tanto tempo, o primeiro desses problemas e, talvez, o de maior significado, tem a ver com o pesado legado de fontes bibliográficas eruditas “poluídas”.
Trata-se aqui do problema de “retroalimentação”, ou seja, da reintrodução no ensino contemporâneo de teorias desacreditadas pelos estudos científicos. Ora legitimadas por novos argumentos, ora envoltas nestas latitudes numa nova roupagem acadêmica, não é inconcebível que a maioria das obras sobre a África estejam sutilmente imbuídas de tenazes e profundos preconceitos contra os povos e as civilizações africanas.
A avaliação das fontes de ensino
Há em toda a América Latina uma carência de material didático sobre a África, em línguas portuguesa e espanhola. Esta questão não será resolvida tão cedo, considerando que a tradução e publicação das obras estão submetidas a considerações de mercado e da política das grandes editoras. Corre-se o grande risco de que se privilegiem para a tradução em língua portuguesa, precisamente, obras preconceituosas ou desatualizadas, situação com a qual haverá que coexistir durante um longo tempo.
Obras dos cientistas africanos
Até os anos sessenta do século XX, a produção sobre a história da África esteve inquestionavelmente monopolizada por africanistas europeus, americanos e árabes, majoritariamente imbuídos de uma visão fundamentalmente essencialista e raciológica. Essa tendência tem diminuído em parte, mas não desaparecido, com o crescimento exponencial de especialistas e cientistas africanos dedicados ao estudo do passado de seu próprio continente. Trata-se de especialistas que conhecem a África a partir de dentro, através das mentalidades, cosmogonias, línguas e estruturas que moldaram aquelas sociedades ao longo da mais extensa história do planeta.
CONCLUSÃO
O avanço constante do conhecimento científico sobre a África, em especial nos campos da paleontologia e da antropobiologia, não cessam de confirmar que esse continente foi o lugar privilegiado onde surgiu a consciência humana e onde se elaboraram as experimentações que conduziram à vida em sociedade. Contudo, a lentidão da assimilação/integração desses dados revolucionários, pelo meio acadêmico, continua sendo um problema, razão pela qual a reatualização dos conhecimentos deverá constituir peça importante do processo didático. À primeira vista, uma das formas eficientes de alcançar esses objetivos seria a organização de oficinas de formação para agentes multiplicadores selecionados, preferencialmente, entre os docentes das disciplinas humanas, e não somente na disciplina histórica.
A sensibilidade do docente determinará, em muitos casos, a predisposição à aceitação, ou à rejeição, das teses raciológicas e das manipulações legitimadoras que, inevitavelmente, vestirão a roupagem “acadêmica”. O docente incumbido do ensino da matéria africana deverá cultivar sua sensibilidade em relação aos povos e culturas oriundos deste continente. Num país como o Brasil, onde as tradições e culturas africanas nutrem de maneira tão vigorosa a personalidade do povo brasileiro, a empatia para com a África apareceria como algo natural, mas ela não é, apesar de todos os brasileiros serem herdeiros das tradições e cosmovisões desse continente.
Os novos desafios
A O professor/a incumbido/a da missão do ensino da matéria africana se verá obrigado/a durante longo tempo a demolir os estereótipos e preconceitos que povoam as abordagens sobre essa matéria. Estamos diante de novas tentativas de banalização dos efeitos do racismo e das agressões imperialistas por parte de verdadeiros soldados ideológicos da visão e das estruturas hegemônicas que tomaram conta do planeta.
Os estudos sobre a história da África, especificamente no Brasil, deverão ser conduzidos na conjunção de três fatores essenciais: uma alta sensibilidade empática para com a experiência histórica dos povos africanos; uma constante preocupação pela atualização e renovação do conhecimento baseado nas novas descobertas científicas; e uma interdisciplinaridade capaz de entrecruzar os dados mais variados dos diferentes horizontes do conhecimento atual para se chegar a conclusões que sejam rigorosamente compatíveis com a verdade.
Esses três pré-requisitos estão vinculados ao problema mais geral que se radica na necessidade de chegar-se a um maior grau de compreensão das diferenças e da alteridade, como fatores estruturantes da convivência humana. O conhecimento do Outro, de sua identidade étnica, cultural, sexual ou racial, do seu percurso humano, de sua verdadeira inscrição histórica, possibilita a convivência confortável, se não feliz, com as diferenças fundamentais.
A/O professor/a incumbida/o da missão do ensino da historia dos povos e das civilizações da África – que, como já vimos não é uma história qualquer – dificilmente poderá permanecer insensível a todas essas considerações. Pensamos que, pelo contrário, a sua eficácia pedagógica terá uma maior repercussão e abrangência na medida em que a sua sensibilidade empática para a matéria e para o seu entorno social seja elevado.
Nota Importante
- A Lei nº 10.639, de 09 de janeiro de 2003, altera a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, das Diretrizes e Bases da Educação Nacional, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. O Parecer CNE/CP 003/2004 e a Resolução CNE/CP 001/2004 regulamentam esta lei.

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